NINGUÉM
o cemitério fala com o inferno
o que é horrível nas epígrafes da viagem
dos nomes e das tumbas
a noite termina em teus lábios
outono encontrado
em algo antigo
de onde ninguém volta
ninguém alcança o voo
do nunca mais
ninguém quer destruir teu luar
a miséria louca
grita no corredor do nada
sua vingança será um amor
demasiado pequeno
demasiado só
a luz do dia
tem certezas velozes
a rosa das nuvens
te deslumbra
a rosa do nada
sentiste em sonho
as vagas do mar
quebrando em meu peito
ARCO-ÍRIS
não queres recordar mais
o que foi destruído
algumas vozes
e alguns ecos
materializam o pouco que somos
damos menos importância
ao que imaginamos
até o último nada
e na cama no verão
imaginamos o frio
e a garoa de uma rua solitária
as coisas escorrem
pela língua
um assombro acústico
entrada proibida
na porta do nada
as flores tecem teu caminho
até a lágrima
não há árvores em torno
de tua casa
nem mar
uma enxame de estrelas
em teu jardim quebra
contra tua voz
a determinação do tigre
move tua mão de neblina
e saudade
tua voz ascende uma palavra
na dobra da noite
sou um outro
sou minha negação
e sou neutro
no silêncio da solidão
o desejo sempre aceso
na dobra do corpo
na dobra do outro
e seu centro
***
se extraviaram as horas
e os poemas perdem suas palavras
eu fui nada do nada
um grito no vidro da noite
uma cicatriz na neblina
sonhos pesados
são esquecidos
no espelho
e no açude
a porta do céu
flutua à tua frente
a página em branco
é um caminho
***
silenciar, viver o não escrito
sondar vertigens
o mar escuro de tua voz amarga
pálido lago azul do céu
a dor e a espera
***
a morte revolveu tuas cinzas
na região dos distantes
bebi em teu poço
um céu em ruínas
cego repousei ao teu lado
até as rosas se incendiarem
a febre no azul dos teus olhos
está fechada no jarro dos sonhos
as horas rondam teu signo
até se tornar tigre ou espelho
pensas em pinheiros sangrentos
e jogas o silêncio pela janela
o rio do silêncio outona
tua neblina
teus cavalos alados
tua epiderme
a flor do tempo
não quero viver teu pensamento abstrato
não quero a rosa em pétalas
em tua face irreconhecível
longe do caos
quero deitar na relva
e contemplar
o arco estelar
a mão que nos separa
degola sereias e crepúsculos
deixei meu coração em tua janela
fui uma árvore num outono distante
pela escada da noite
cheguei até uma hora vazia
em ruas de sonho me perdi
a morte obscura balança
enforcada noite adentro
com as mãos cheias de anos
olhas o mar
e sussurras uma senda
no infinito da distância
meia noite e estou escuro
sou a lágrima
o punhal
e alguém que desapareceu
dos teus olhos
o tempo estrangulado
te dá outra existência
estrela distante
no bico do corvo
o signo é uma essência
o céu detém teus olhos
com uma chuva lenta
eu fumo e leio poemas
***
tudo esta por vir
inclusive nós
o cristal do espelho
é como tua distância
que ultrapassa uma nuvem
e uma estrela
brincas com os relâmpagos
na chuva
teu coração está
num barco na noite
velozmente dormimos
e chegamos ao crepúsculo
nas rosas de sangue
que giram entre
as horas
a chuva detém teus olhos
costura teu humor
ao infinito
o cadáver do mar
é tragado pela lua
uma dia raro
entre os ventos brutais
de tua ausência
a estrela oculta sua chama
nos teus olhos
pegadas escuras
em claros sonhos
o rio se levanta e caminha
areia adormecida
na manhã d’água
a trabalho das mãos
alumia o vento
na praia
no mais profundo
da memória
respiro teus astros
e chamávamos morte
o que florescia
no espelho
***
vaga tua sombra
por um lugar ignorado
a doce manhã de agosto
chora corvos
a praia aberta
nada em teu corpo
presente
chove a manhã
inteira
sonhamos despertos
o silêncio onde dormimos
o verão responde sua face ao vento
na obscuridade das nossas vozes
tramam peregrinações até o último segundo
***
outros olhos te encontram
num tempo exato e vazio
no último minuto da identidade
o corvo secreto
de incógnitas palavras
nos mares do nada
a febre dos minutos
cruza com a luz do caminho
as noite vêm e vão
num bordado branco
de alvoradas
***
as ruínas do verão
nos deixou atrasados
para a alma do tempo
ardem sonhos congelados
e se perseguem sereias
em tua voz escura
a imagem
e sua miríade de olhos
perseguem o pó
até encontrar um rosto
que quando soprado
das dunas
tem seus traços alterados
atravessamos a vasta
cegueira do nada
e respirados os caminhos
internos junto ao coração
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